Jesus e o Relacionamento Conjugal

É uma mulher sofrida. Casada há muitos anos, ela sofre os maus tratos de um marido que bebe descontroladamente e depende dela para tudo, inclusive para seu próprio sustento. Disse-me que está cansada. “Vai ser assim pelo resto da vida?”, perguntou ela em tom de desespero.

Outra mulher é jovem, recém saída da lua de mel. Disse-me que não reconhece no marido o moço com quem se casou. “De repente, ele só quer saber de trabalhar, trabalhar. Parece que nem pensa mais em mim. Antes, conversávamos horas seguidas, por telefone ou em pessoa. Agora, ele gruda na televisão quando chega em casa e eu fico querendo conversar, sem ter com quem.”

Uma mulher solteira chora por não ter encontrado alguém que a ame e a eleja como sua companheira. Outra, casada, chora porque sente-se mais solitária agora que é casada do que quando era solteira.

Relacionamentos! Não podemos viver sem eles e não conseguimos viver bem com eles.

Os problemas entre as pessoas começaram assim que o primeiro casal escolheu afastar-se dos propósitos de Deus e seguir seu próprio caminho. O clima de harmonia, companheirismo, compreensão e aceitação enlevada das diferenças que havia entre eles foi vergastado pelo vento frio do medo, da vergonha, das acusações e das desculpas. E foi essa a herança que eles legaram a todos os seres humanos que vieram depois deles.

Entretanto, não foi assim que fomos feitos para viver. Nosso coração anseia profundamente pelo amor e pela apreciação de que precisamos para nos tornar pessoas completas, realizadas. O que nos leva ao relacionamento mais íntimo que existe, o casamento, é a esperança de que o outro seja quem vai nos dar tudo isso. Esses anseios profundos se manifestam na vida das pessoas na forma de um vazio, uma inquietação, um senso de solidão que as leva na direção do outro, na esperança da plena satisfação dessas necessidades. Não há nada errado com esses anseios. Deus nos criou assim, para viver a dois, e Seu plano não mudou depois que o pecado tomou conta da vida dos seres humanos. O que mudou com o pecado é a maneira como buscamos satisfazer as nossas necessidades básicas como seres humanos.

Compelidos por elas, buscamos uma maneira de forçar outra pessoa igualmente carente a nos dar aquilo que queremos, usando para isso todo tipo de manipulação. Cobramos, criticamos, corrigimos, isolamos, gritamos, choramos. E quando nada disso funciona, achamos que a solução é abandonar o barco e procurar a satisfação em outro relacionamento.

Problemas nos relacionamentos começaram com o primeiro casal e já eram bem conhecidos quando Jesus viveu na Terra. Por isso, quando alguns fariseus tendenciosos questionaram o Mestre qual seria o motivo válido para o divórcio, Ele respondeu à pergunta rementendo-os ao princípio de tudo, ou seja, à intenção criadora de Deus.

“Não tendes lido que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e que disse: Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne?” (Mt 19:4-5)

Citando o livro de Gênesis, Jesus mostrou aos seus questionadores que a solução para os problemas do casamento não se encontrava na lei do divórcio, mas, sim, na compreensão e aplicação daquilo que Deus planejou para a vida a dois. Somos chamados a ministrar um ao outro o grande amor e a graça de Deus pelas pessoas através da nossa feminilidade e masculinidade. Fomos especialmente capacitados para isso, mas, como no jardim do Éden após o pecado, a nossa maneira diferente de ser, hoje distorcida, nos separa em vez de prover a forma mais perfeita de intimidade entre dois seres humanos.

Já disse um autor, muito sabiamente, que “o amor e o casamento são os meios mais poderosos de que o Pai celestial dispõe para transformar suas criaturas insensatas em filhos e filhas. Mas, em muitos casos, as conseqüências imediatas são tão diversas das desejadas e esperadas que muita gente tem dificuldade em acreditar que Ele está de alguma forma promovendo o seu bem. E essa dúvida seria razoável se o objetivo final das coisas fosse o casamento. Mas o objetivo final é vida – que possamos nos tornar filhos de Deus, após o que todas as coisas correrão seu curso grandioso e natural”.

Sim, o casamento é uma ferramenta poderosa nas mãos de Deus para nos transformar em filhos e filhas. Devido à própria proximidade que esse relacionamento produz, é dentro dele que vamos sofrer as maiores dores, as mágoas mais profundas que alguém possa nos causar. É dentro dele que nos tornamos mais conhecidos, e por isso mesmo, mais vulneráveis. Mas Deus já sabia de tudo o que enfrentaríamos e veio ao nosso encontro na nossa vulnerabilidade, ensinando o melhor caminho para revertermos a situação que hoje vivemos e provendo um exemplo claro para seguirmos. Esse exemplo, tanto para os maridos quanto para as esposas, é o próprio Senhor Jesus.

Em 1 Pedro 3:1-7, temos instruções bem simples e claras tanto aos maridos quanto às esposas. Ao se dirigir a cada um dos dois, o apóstolo começa usando a palavra “igualmente”: “Mulheres, sede vós igualmente submissas a vosso próprio marido…” e “Maridos, vós, igualmente, vivei a vida comum do lar com discernimento….” (O grifo é meu.) Ora, igualmente a quê ou a quem?

No trecho que antecede essas ordens (o verbo está no imperativo, portanto é uma ordem, não um pedido ou sugestão), o autor está falando de Jesus: “Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos” (2:21). Jesus sofreu calado, sem revidar, sem fazer ameaças. Mas não apenas isso. Ele se entregava nas mãos daquele que julga retamente” (2:23).

Esse é o segredo da atitude de Jesus. Ele sabia que Deus o defenderia e cuidaria Dele. E é o Seu exemplo que temos para seguir, tanto maridos quanto esposas. A mais triste e difícil situação que alguém possa estar vivendo no casamento é um instrumento nas mãos de Deus para moldá-lo e transformá-lo. Ele não promete restaurar todos os relacionamentos, mas promete que, se nos entregarmos em Suas mãos, Ele mesmo nos defenderá e ajudará (Isaías 50:7-9).

Como o exemplo de Jesus serve de orientação para os maridos? É só ver a maneira como Ele sempre tratou as mulheres com quem se relacionou – com dignidade, respeito, compreensão, firmeza e carinho. Em uma palavra, Ele as tratava como iguais, igualmente responsáveis diante de Deus por suas ações. Assim, Ele não passava a mão em suas cabeças quando estavam erradas, não! Antes, lhes ensinava a buscar o que tinha realmente valor. Conhecendo sua preocupação natural com as coisas do dia a dia, como acontecia com Marta, Ele apontou o lugar do importante antes do urgente. As pequenas obrigações podem roubar às mulheres o privilégio de estar cultivando as coisas do Espírito.

A samaritana, uma mulher sofrida, de vida no mínimo atrapalhada, Jesus tratou com toda a dignidade. Foi a ela que Ele primeiro se revelou como o Messias prometido, conversando com ela sobre coisas profundas e importantes, no pleno conhecimento de que ela, uma mulher rejeitada por todos, tinha capacidade para entender as verdades espirituais de que lhe falava.

Jesus não condenou a mulher apanhada em adultério, mas tratou-a como uma pessoa responsável por suas prórias decisões, perdoando-a e exortando-a a mudar de vida.

Jesus entendia perfeitamente as mulheres. Afinal, Ele as fez como são. Sabe que elas foram feitas diferentes dos homens de propósito – e um propósito bom. Ele quis que existíssemos como homens e mulheres, diferentes mas complementares. Também entendia as distorções que o pecado causou em Suas criaturas. Por isso Ele as tratou sempre com respeito, compaixão, compreensão e firmeza, perdoando seus pecados, levando seus fardos, aquietando suas ansiedades e as encorajando a ser tudo o que as fez para ser, oferecendo-Se para lhes saciar a sede com um amor perfeito e eterno.

Essa é a compreensão que o apóstolo Pedro exorta o marido a ter quando lhe diz que deve viver dentro de casa com discernimento, com compreensão dessas verdades. E tem mais. Ele avisa os maridos que, se não tratarem suas esposas como co-herdeiras da graça de Deus, suas orações serão interrompidas! Trata-se, pois, de uma questão de ordem espiritual.

 

O apóstolo Paulo diz aos maridos que amem suas esposas como Cristo amou a igreja, dando Sua vida por ela (Ef 5:25). O verbo amar, usado pelo apóstolo Paulo, vem do grego agapao que significa afeto benevolente, amor doador, sempre voltado para o bem da pessoa amada. Amar assim é agir em favor do outro mesmo sem receber nada em troca. Essa é a palavra usada para falar do amor do Deus que é amor. Deus ama porque Ele é amor! Não se trata, portanto, de um amor natural ao ser humano pois nós não somos amor. Antes, precisamos dele como algo essencial à nossa natureza. Então, como o marido pode amar assim a sua esposa?

Quando o amor sobrenatural de Deus encher seu coração, ele estará capacitado a olhar para a esposa pelos olhos amorosos do Senhor.

O amor que Jesus teve para com a igreja tinha um objetivo claro: santificá-la, purificá-la, torná-la gloriosa, sem mancha nem ruga, porém perfeita. Olhe só o potencial do amor do marido na vida da esposa! É o amor que provê para as necessidades dela, tanto físicas quanto emocionais e espirituais. É o amor que a protege contra ataques e acusações externos e muitas vezes até mesmo de suas próprias características femininas distorcidas pelo pecado. É o amor que a liberta para ser tudo que Deus a fez para ser, promovendo seu aperfeiçoamento como pessoa. É o amor que honra e edifica.

A mulher que for amada dessa forma sentir-se-á como uma rainha e tratará seu marido como um rei.

E às esposas, que exemplo Jesus deu? A ordem que as esposas recebem de serem submissas a seus maridos pode parecer mais dura do que a dada aos maridos, mas realmente não é. Se pensarmos bem, amar com o amor agape significa dar a vida pelo outro. E submeter-se a alguém significa dar a vida pelo outro. E o exemplo das duas coisas é o Senhor Jesus. Ele não nos pede nada que já não tenha feito por nós.

Jesus é a demonstração perfeita do que é submissão. Ele mesmo nos diz o que ser submisso significava para Ele: “Por isso o Pai me ama, porque eu dou a minha vida para a reassumir. Ninguém a tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou. Tenho autoridade para a entregar e também para reavê-la. Esse mandato recebi de meu Pai” (Jo 10:17-18). Se Jesus não tivesse optado por entregar Sua vida por nós, ninguém O teria podido matar. E Ele diz que o fazia espontaneamente. Essa é chave da verdadeira submissão.

Ninguém pode obrigar uma esposa a ser submissa, nem dando com a Bíblia na cabeça dela, porque a verdadeira submissão é interior, é uma atitude do coração. É também uma questão espiritual, pois depende de uma confiança total em Deus para entregar-se em Suas mãos.

Mas é claro que vamos descobrir bem depressa que, mesmo sabendo todas essas coisas, nosso coração vai se revoltar muitas vezes contra o que Deus nos ordena fazer como maridos e esposas. “Ah, essa não! O Senhor não conhece a minha mulher!” “O Senhor deve estar brincando! Sabe o que acontecerá se eu abaixar a cabeça para ele?”….. E assim por diante.

Quantas vezes, como esposa, submeter-me ao meu marido parecia uma agressão contra mim mesma, uma negação de quem eu era. Até que descobri que o exemplo de Jesus tinha um segredo. Ele não apenas sofreu calado, engolindo todas as afrontas e abaixando a cabeça diante de autoridades que tinha poder para pulverizar com um olhar. Antes, pôde ser-lhes submisso porque “se entregava nas mãos daquele que julga retamente.” Estava fazendo o que Deus lhe pedira, de coração, porque sabia que podia confiar em Seu Pai. E era o próprio Pai quem O capacitava a obedecer, num entrosamento perfeito de vontades e propósitos: “Eu nada posso fazer de mim mesmo; na forma por que ouço, julgo. O meu juízo é justo porque não procuro a minha própria vontade, e, sim, a daquele que me enviou” (João 6:30).

Quando permitimos que o Espírito que em nós habite nos ensine a viver com a mesma atitude de Jesus, Ele usará todas as circunstâncias pelas quais tivermos de passar para nos moldar à imagem do Senhor Jesus. Não é ao meu marido que estou sendo submissa, mas a Deus. Se para isso eu tiver de entregar algumas coisas que me são muito importantes, tenho de pensar em Jesus e no que Lhe custou a obediência ao Pai – a própria vida.

Assim, é à entrega da vida um pelo outro que somos ensinados a viver no relacionamento conjugal. Por ser o lugar que permite a maior intimidade possível entre os seres humanos, é também onde seremos mais fortemente provados em nossa obediência a Deus. Mas quando, como Jesus, nos entregamos nas mãos Daquele que julga retamente, podemos obedecer tranqüilamente e deixar as conseqüências com Ele.